Anos atrás vi a apresentação de Dado Villa-Lobos na MTV em seu show Jardim de Cactus. Tudo passou sem euforia. O trabalho não caiu na mídia como deveria, o público não despertou para a obra como esperado... mas eu e outros sensatos que entendem ou ao menos tentam entender de música de qualidade logo perceberam o brilhantismo por trás da obra.
Ora, Dado tem todo um histórico musical que o privilegia, e se você desconhece, pare de ler esse post agora porque aqui não é seu lugar! Para aqueles que sabem o significado de Legião Urbana e Heitor Villa-Lobos percebem o que estou tentando explanar. Todavia, em seu álbum do projeto MTV Apresenta, o compositor vai além ao revelar que é plenamente capaz de caminhar com as próprias pernas, ou tocar com as próprias palhetas. Não esconde suas raízes, mas também não faz questão de exacerbá-las. Como sempre, muito calmo, numa tranquilidade monástica, executa toda sua performance em canções profundas dotadas de um lirismo impressionante, e claro, o rock também está lá.
De cara, nos brinda com uma batida instigante e a frase de seu ancestral. "Deus nos botou dois ouvidos p'ro seguinte: quando a emoção é grande que a gente ouve, ouve-se com dois ouvidos. Quando ela não é muito grande, entra por um e sai por outro. Essa é que é a forma natural de a gente ser sincero em favor da arte universal."
Com Paula Toller, traz a composição tema Jardim de Cactus, e prossegue pelas perfeitas Diamante e Dias - "Governos me esfolam. Mulheres me desgovernam." Tendo outras presenças mais que ilustres e o total apoio de sua back vocal (infelizmente desconheço o nome), desenha um jardim de cactus para ser apreciado sutilmente. Até Chico Buarque (de quem não sou muito fã, diga-se de passagem), empresta sua voz na música Natureza.
Junto com seus eternos amigos, Os Paralamas do Sucesso, que por motivos óbvios lhe deram o título de soldado da paz, fazendo uma ponte com a canção, e Dinho Ouro Preto, fecham com Conexão Amazônica dos legionários parceiros antigos.
Em nenhum instante Dado se esforça. Sua voz segue num mesmo ritmo e seus gestos são contidos. Quem o vê poderia se iludir acreditando numa timidez. Talvez ela até exista, mas nesse caso, com ouvidos mais argutos, notamos que ele só está em transe, entregue a sua musicalidade. E se apurarmos ainda mais nossos sentidos, verificaremos que dois ouvidos são bons, mas para escutar Dado Villa-Lobos e seu Jardim de Cactus, um só bastava.